A quatro dias da segunda volta das eleições francesas, Segolène Royal e Nicolas Sarkozy encontraram-se, ontem, para o derradeiro debate. A SIC Notícias tinha programado a sua transmissão em diferido às 0h30m, horário absolutamente proibitivo para quem trabalha no dia seguinte. Optei por ver o debate na TV5 Monde a partir das 20h00, em directo e na versão original, razão pela qual peço desculpa se cometer algumas imprecisões.
Foi um debate longo (2h30m...) mas não enfadonho. Interessante. Tão interessante quanto é possível ser um debate com este formato: cuidado em garantir o mesmo tempo para cada candidato, controlado ao minuto e com moderadores cuja interferência se resumiu a lançar os temas para cima da mesa.
Gosto de ver estes debates pelo seu conteúdo mas não sou alheia à forma. E aí estivemos perante algo impensável em Portugal. Patrick Poivre d’Arvor e Arlette Chabbot, os jornalistas moderadores, dirigiram-se aos candidatos assim: Segolène Royal e Nicolas Sarkozy. Sem Madame ou Monsieur. Menos ainda senhores doutores. E dizemos nós que os franceses são vaidosos...
Ainda às voltas com a forma, quando os jornalistas saudaram os candidatos perguntando como estavam, a Royal saiu um “très bien” tão baixinho que por mim podia ter dito “fixe” que ninguém dava por isso. Sarkozy não só foi mais expansivo como tratou de logo ali apoderar-de de mais de um minuto.
Talvez se justifique já esclarecer que ideologicamente me sinto mais próxima de Nicolas Sarkozy. Admito que, enquanto mulher, me agradaria ver Segolène Royal à frente dos destinos da França. Assim a jeito de experiência. Mas o mundo não é um laboratório e quando se trata dos seus destinos pouco me importa se é homem ou mulher, preto ou branco.
Não discordo em absoluto quando a imprensa de hoje diz que o resultado foi um empate. Mas apenas e só porque Sarkozy está mais à vontade nas questões económicas e Royal nas questões sociais. Mas foi, digo eu, um empate sem golos.
Ainda assim gostei mais da prestação de Sarkozy. Royal pareceu-me tensa de início face a um Sarkozy mais descontraído. Ele, com uma postura de político profissional; ela, com um discurso inicial nitidamente pré-programado quase como se houvesse um teleponto. Contudo melhorou nitidamente ao longo das duas horas e meia de debate.
Os temas abordados foram os que preocupam os franceses mas que não lhes serão certamente exclusivos: concepção do poder, dívida, emprego, pensões, habitação, saúde, fiscalidade, educação, Europa, imigração e reforma das instituições. Faltou, na minha perspectiva, que se discutisse onde cada candidato se situa na relação com os EUA.
Sarkozy foi mais preciso nas propostas e no domínio dos números. Royal, das poucas propostas concretas que apresentou, saiu-se com a de que cada mulher das forças policiais seja acompanhada a casa, à noite, por um elemento masculino, ideia que visa combater os mais recentes casos de violações.
A faísca verdadeiramente só apareceu quando o tema foram as 35 horas de trabalho. Tema que, aliás, não foi favorável a nenhum dos candidatos. Sarkozy, que é nitidamente contra, não assume a coragem para voltar atrás. Segolène, que é a favor, não soube explicar como assegurar o pleno emprego, ancorando-se sempre no apoio dos parceiros sociais. Não menos efusivo o debate à volta da questão nuclear e das necessidades energéticas da França. Segundo a imprensa de hoje ambos estavam enganados quanto aos valores da importância da energia nuclear em França que, segundo os especialistas é de 40%, ao contrário dos 17% defendidos por Royal e os 50% defendidos por Sarkozy.
Quanto aos outros temas foi aqui que Sarkozy marcou pontos. Não tanto pelas ideais que defende mas como as defende. Enquanto Royal andava às voltas procurando não dar respostas definitivas que a possam comprometer no futuro, o candidato da UMP foi peremptório: não à adesão da Turquia, não à VI República, não a um novo referendo a uma nova constituição europeia, não à abertura da França a países que não se abrem à França (“ a França não pode acolher toda a misérias do mundo”).
Quando, na parte final, foram convidados a fazer uma apreciação pessoal mútua, Sarkozy não se negou e mostrou apreço pela competência da sua adversária e referiu que não foi em vão que ela chegou até ali. Já Segolène preferiu enfatizar o combate de ideias insistindo que ambos pensam de forma diferente, não tendo proferido quaisquer palavras de carácter pessoal em relação ao seu adversário.
Antes de dar por terminado o debate a cada um foi dada oportunidade de se dirigir aos franceses pela última vez naquela noite. Sarkozy voltou a falar de acção realçando o valor do mérito, do esforço, da recompensa do trabalho. Segolène, que não tinha querido ser pessoal, não se coibiu de referir ser mãe de quatro filhos. Falou da importância de ser mulher, de audácia (Barack Obama de saias?? ) e do exemplo de Angela Merkel.
Não voto nas eleições em França. Se votasse, antes do debate votaria em Sarkozy. Depois do debate também.
Ele chama-lhe “choix de vie” e assumiu: “je me suis preparé pour cet rendez-vous”. E, digo eu, preparou-se também, toda a vida, para ser presidente da República Francesa.
Vive la France!
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2 comentários:
Do pouco que vi do debate, achei Segolène pouco segura do que dizia e por vezes a gaguejar. Também não gostei da ironia...não achei necessário.
Quanto a Nicolas, tenho de reconhecer que é um excelente orador/comunicador/actor.
Se tivesse de votar? Teria dificuldade...
Já agora um pequeno à parte que me esqueci de referir: a postura das televisões em Portugal. Vá lá saber-se porquê o resumo do debate que a RTP apresentou dá uma ideia completamente errada do que se passou. É incrível o poder de manipulação. Eu vi o debate do príncipio ao fim sem interrupções e depois deparo-me com o triste trabalho daquele canal de televisão. E o que fizeram eles? Mostram a reportagem da seguinte forma: Segolène a atacar e Sarkozy a defender-se. Se a RTP fez de propósito, foi infeliz. Se se limitou a passar o bloco de imagens de um qualquer canal francês é incompetente pois mostra nem sequer ser capaz de montar as suas próprias reportagens.
Ah...e agora o momentinho orgulhozinho tuga: a seguir ao debate deu um programa chamado “France 2007” apresentado pelo Philippe Dessaint que tinha como convidados 5 jornalistas estrangeiros e um francês. Entre os estrangeiros estava Ana Navarro Pedro, jornalista da “Visão”.
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