terça-feira, 29 de maio de 2007

Um vizinho no caminho

Não sei se já aqui partilhei a pouca atenção que presto aos dias disto e daquilo e sei lá mais o quê. E nestes incluo o dia da Mulher, dos avós, dos namorados, amantes ou quejandos. Os últimos deve ser por não ter nenhum deles: nem namorado nem amante e o mais foneticamente próximo de quejando só mesmo queijadas de Sintra quando por lá ando. E nem sempre porque os travesseiros da Piriquita saem sempre vitoriosos na hora de decidir.
A cada ano que passa alguém decide atribuir um dia do ano ao que quer que seja e devo andar tão mal informada que desconheço que ocasiões deveria eu estar a festejar. Hoje, curiosamente, celebra-se o dia europeu dos vizinhos. Não podia vir mais a jeito uma vez que é tema que ando para abordar aqui há algum tempo.
Há dias atrás vi-me na iminência de fotografar dois espécimes da minha vizinhança e exibi-los aqui. Só não o fiz porque no dia em que alguém cá da terrinha aqui viesse parar sem querer não teria dúvidas quanto à proprietária desta casa na Sibéria e eu não quero que eles saibam onde passo férias. Assim como não pretendo expor-me em demasia sinto que devo estender esse privilégio aos meus vizinhos e não publicitar aqui estes modelos exclusivos que rodeiam a minha residência.
E por enquanto estou apenas a referir-me aos modelos estilísticos. Digamos que uma das vizinhas é uma espécie de “female white version” do Stevie Wonder enquanto a outra, não a conhecesse eu a vida toda, e diria que uma afegã tinha acabado de aterrar aqui. Não, não tenho nada contra afegãs, mas se algum dia vier a ter uma como vizinha que tenha ao menos um bocadinho de bom gosto. O exemplar que não poucas vezes aqui tenho perante o meu já adestrado olhar veste única e exclusivamente de roxo. Uma espécie de “burka” de remendos sempre acompanhada por calçado a condizer, geralmente forrado pela própria. O tecido que sobra dessa árdua tarefa é posteriormente aplicado ao balde do lixo e, desconfio, a ver pela devoção violeta, a outros equipamentos domésticos. O Gene Wilder tinha uma “Woman in Red”, eu tenho aqui uma “Woman in Purple”. Dirão vocês: “cada um tem o que merece”. Digo eu: a viver num sítio assim nem é preciso ir ao cinema. E é isso mesmo que isto aqui parece: uma sala de cinema. Há uns banquinhos que eu ainda não tive tempo de dinamitar (alguém tem o número do Almeida Santos?) que poderiam bem ser as cadeiras de uma qualquer sala de cinema e a minha casa é o ecrã gigante.
Já terão percebido que a perspectiva de vizinhança que aqui se aborda não é uma perspectiva urbana tipo a do 2° esquerdo ou a do 3° direito. É mais a da vizinha da frente, a do lado, a de ali mais à frente e a de já a seguir. Não me interpretem mal: gosto dos meus vizinhos. Mas eles são como as crianças: o seu melhor é quando não nos moem o juízo. A metáfora é infeliz, eu sei, mas apostei com uma amiga em como eu conseguia fazer metáforas mais estúpidas que o ministro Mário Lino.
Mas não se pense que a minha vizinhança é tão somente um atentado à visão. Outros sentidos saem a perder na contenda. Quanto ao olfacto e ao tacto não posso dizer porque tenho uma espécie de “restraining order” que os proíbe de se aproximarem de mim num raio de 5 metros (distância que vai da minha janela aos banquinhos ainda não dinamitados). Mas a audição, meu Deus, a audição!!!
Estatisticamente, e porque fica sempre bem exibir uns números, cerca de 90%* dos meus vizinhos são verdadeiros Ferraris da capacidade vocal: vêm equipados com o melhor conjunto de pulmões, diafragma e cordas vocais. Atingem os 130 decibeis mais depressa do que o Ferrari passa dos 0 aos 100. E isso tanto pode ser a dizer “bom dia” quando se cruzam na rua como quando se encontram para comprar o pão numa carrinha que aqui apita pela manhã (160 decibeis...).
O expoente máximo da calamidade chama-se Hugo. Mais uma vez vos peço que não me interpretem mal: o Hugo é um anjinho (not really...) de 3 anos de idade. O Hugo faz o que lhe compete: brinca. A avó do Hugo não faz o que lhe compete: tomar conta dele. O que faz ela então? Instala-se num dos banquinhos com demolição agendada e vocifera: “oh Hugo, não vás para aí”; “oh Hugo, olha os carros”; “oh Hugo, olha que vem aí o homem do saco” (versão entretanto actualizada para “oh Hugo, olha que vem aí o gajo caucasiano com mais ou menos um metro e setenta, careca na cabeça e com cabelo comprido na nuca). Uma tarde passada em casa e ouço isto tantas vezes quantos os directos da SIC Notícias a partir da Praia da Luz para dizer que não há nada a dizer.
Anseio pelo dia em que o Hugo tenha idade suficiente para poder ir “para ali” (onde quer que isso seja) e que tenha idade para conduzir carros em vez de fugir deles. Só assim a avó sossega. E eu também.
Gosto dos meus barulhentos vizinhos. São gente para vir aglomerar-se à minha porta cada vez que o Sporting é campeão (como já repararam poucas vezes precisam quebrar a “restraining order") ou para me trazer um chá se eu estiver doente. Mas acreditem que há dias em que gostava que fossem assolados por um surto de disfonia. E já agora eu também gostava de ganhar o euromilhões. I wonder which will happen first...



* os outros 10% são a percentagem que trabalha com alguma regularidade

8 comentários:

Laurentina disse...

Euromilhões?!

Ah ah ah ah ah olha que piada ...também eu queria , mas quem cria dá leite e quem mama que se ajeite...sem ofensa claro .

agora vou mesmo xau

Laurentina disse...

Nikp...
As nomeações ja foram entregues na administração do tomatal.
Eh eh eh eh se quiseres podes ir conferir ai vai o link.
http://blogcomtomates.blogspot.com/

Beijão grande

Anónimo disse...

Olá cara amiga! não te admires da hora..pois isto de actualizar o blog tem os seus custos! Mas hoje ao visitar a tua casa deliciei-me com os teus vizinhos e com a tua capacidade fantástica de fazer humor! Mereces é o prémio da pessoa com maior humor que eu conheço na vida, humor inteligente e criativo.. Onde andam os produtores deste país que ainda não te contactaram.. É que argumentistas e guionistas do teu nível, não sei se haverá!!! Adorei, ri-me imenso... e quase que os via a menos de 5 metros... O que vale é que estou mais longe e posso ler e desligar ao contrário de quem vê a SIC e a SIC Noticias, que a cada noticiário é mais Praia da Luz que do resto do país! Enfim, posso ser que algum dia possas fazer zapping definitivo aos teus vizinhos... Mas olha que se calhar vais sentir falta deles depois!!! E bora lá ganhar o Euro milhões!! Tudo de bom! Beijos! Rick

Anónimo disse...

Ora muito bom dia, sim porque começar o dia assim vale a pena.

Como sempre parti-me a rir e não consigo parar... daqui a pouco o écran desmancha-se todo como o meu ar patético aqui a rir sózinha.

Para quem não sabe, tenho o ENORME privilégio de ser a irmã mais velha da Nit Futura Estrela da Escrita de quem sou a fan Number One.

Como é óbvio, os famosos vizinhos também os conheço desde sempre e o que aqui se escreve é a pura verdade. Uma verdade que tem pouca piada quando ela nos invade o quotidiano, mas uma verdade que contada assim lhe dá o ar mais divertido do mundo.

Vou continuar a rir durante um tempo porque tenho a sorte de ter estabelecido o perímetro de segurança a uns 2000 km onde os 130 decibeis não chegam...

Adorava fazer um poster deste texto para os vizinhos o podessem ler... o pior é que os pobres coitados não iam perceber nada da mensagem... E pena!

Beijão grande até a esse sítio que me viu nascer :-)

Anónimo disse...

Olá amiga, não resisto a recomendar a leitura deste teu post pois está um "mimo"! Já agora, como seria de esperar os teus leitores aumentam, e já passaste os 1.000! parabéns! e o caminho é sempre a subir!td de bom! Beijos

s.ibéria disse...

Laurentina, primeiro não ofende nada, pelo contrário, achei um piadão ao provérbio que eu não conhecia. E, já agora, muito obrigada por transmitir as minhas decisões à administração do tomatal que, espero, não as tenha processado hoje por estar de greve.
Rick, muito obrigada pelos elogios, mas assim até me fazes corar. Sabes eu sou assim, passo de semanas de “blues” para um dia de inspiração. Mas com vizinhos como os meus, textos deste tipo saem com a maior das facilidades. Há e já agora, não vás tu pensar o mesmo que a Okelani, a história da aposta de 500€ pelas 1000 visitas é treta. Foi só para picar o anónimo que andou aqui a pastar.
Okelani, acredita que muito do que aqui escrevo é para ti. E se não fosse por ti este blog nunca existiria. E o przer maior que me dá é saber que posso ajudar os teus dias a começarem melhor.
Beijinhos para todos os meus leitores.

Anónimo disse...

Obrigada pela parte que me toca. Continua por favor. Beijões

Anónimo disse...

Amiga arredada que ando destas andanças bloguistas só hoje é que me deparei com este "funtástico" post. E o que dizer da tua sempre presente e comentada vizinhança que desde os tempos da universidade nos deliciavam com as suas "outstanding performances". É Portugal no seu melhor e mais pitoresco e aqui tão perto que até custa a crer. De certeza que no tempo da avó do Hugo os pais não tinham as preocupações que ela hoje se vê forçada a ter, o mais que podia acontecer era o puto levar um coice do burrico que estivesse estacionado por perto. Mas para o bem e para o mal, e infelizmente muito mais para o mal do que para o bem, lá estará a vizinhança sempre pronta a acudir... para logo a seguir ir contar as desgraças a toda a gente.
Jocas